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“A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; [...] acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência”. O artigo 53 do capítulo IV do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) representou um marco na garantia do direito à educação para crianças e adolescentes. Agora, mais do que nunca, todos têm o direito à educação básica - que já era prevista no Capítulo III da Constituição - e o Estado tem a obrigação de promovê-la de forma igualitária, pois ela é indispensável na formação de cidadãos.

O sistema educacional público brasileiro é a alternativa adotada a fim de garantir este direito, representando um projeto fundamental para a existência de uma sociedade mais justa e igualitária. Segundo a pedagoga Ana Patrícia, “a escola exerce um papel fundamental tanto nos aspectos emocionais quanto cognitivos da criança e do adolescente. Uma educação de qualidade desenvolve a interação, o convívio, o repartir, a doação [...] e tudo isso influencia no comportamento, na organização, na convivência e na educação da criança. Então, o ambiente escolar tem grande influência na vida do cidadão”, afirma.

No Brasil, temos um modelo de educação básica que oferece o ensino gratuito desde a primeira infância até a preparação para o vestibular: As creches municipais são uma alternativa para que as famílias da classe C, D e E possam trabalhar e ter onde deixar seus filhos. Ao atingirem a idade adequada, as crianças entram, então, para as escolas municipais, onde permanecem a maior parte da infância – do maternal ao 5º ano. Depois, passam para as escolas estaduais, onde completam o ensino médio, para, então, ingressarem nas universidades públicas.

Esta é a ideia fundamental do sistema, e em consonância com este modelo, são adotadas políticas públicas que buscam atender melhor às necessidades da população e que são, muitas vezes, fruto da luta da própria sociedade, a exemplo de programas e ações criadas pelo governo, como o Programa Escola Acessível, criado para aumentar a acessibilidade no ambiente escolar da rede pública de ensino, e o programa Caminho da Escola, criado para disponibilizar mais veículos que fazem o transporte escolar nas redes de ensino estaduais e municipais.

Mas, como analisamos no livro Ralé Brasileira, de Jessé Souza, “Nós, brasileiros, nunca nos comparamos com a Bolívia, com a Guatemala, ou mesmo com a Argentina. Nós nos comparamos obsessivamente com os Estados Unidos — na realidade, a comparação explícita e implícita com os Estados Unidos é o fio condutor de praticamente todas as interpretações da singularidade brasileira no século 20 — porque percebemos que apenas eles são tão grandes e expressivos como nós mesmos no continente americano.”, e por isso algumas ideias não se adequam à nossa base estrutural e realidade social. Isso significa dizer que há, em nosso país, uma desarmonia entre a teoria e a prática, tudo isso porque a sociedade brasileira sofre de disparidades sociais em todos os seus setores.

 

 Dessa forma, presenciamos no ensino público o descaso com as escolas, a falta de investimento por parte do poder público, o desvio de verbas, a desvalorização dos professores, a falta de materiais básicos de apoio, os salários baixos dos profissionais da educação, a falta da garantia dos programas educacionais, entre outros problemas. À medida que isso acontece, cresce a mercantilização da educação, com escolas privadas cada vez mais caras que se vestem quase que de empresas de marketing para “atrair clientes”.

Tudo isso manifesta uma ideia fora do lugar que é reflexo, acima de tudo, de um histórico social de desigualdade, no qual as políticas públicas não funcionam da maneira correta, favorecendo determinadas camadas da sociedade, e a lógica do favor impera nas relações administrativas e governamentais. Quem sofre com essa realidade, nós já sabemos: aqueles que, ironicamente, precisam ainda mais dessas políticas e são esquecidos e deixados às margens da sociedade. Aquelas crianças e adolescentes cujos pais não possuem capital financeiro para investir em boas escolas. Aqueles que são inseridos num ciclo vicioso de uma educação pública que é oriunda de um processo histórico pautado na desigualdade e que, ao mesmo tempo, acentua ainda mais esta desigualdade. Se a educação básica é um direito fundamental de toda criança e adolescente, e se lhes é assegurado - novamente citando o ECA - “igualdade de condições para o acesso”, por que ela não é ofertada da mesma forma a todos?

É na prática que vemos o abismo entre o ECA e a realidade: enquanto as crianças e adolescentes de classe média têm acesso às escolas mais caras e qualificadas, as crianças e adolescentes de classe mais pobre ficam à mercê dos serviços educacionais administrados pela prefeitura e pelo governo estadual. E apesar da existência dos programas de políticas públicas criados pelo governo, como já foi dito, a qualidade deste ensino ainda está longe de ser ideal. Pois, mais do que um senso comum a todos os brasileiros, o fato de que escolas privadas são mais qualificadas que escolas públicas pode ser comprovado em números: O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, IDEB, é o principal indicador de qualidade da educação do País que expressa de 0 a 10 o andamento dos sistemas de ensino. De acordo com o censo divulgado em 2017 , tanto as escolas públicas quanto particulares obtiveram um aumento no índice de rendimento de 2005 para 2015, mas, ainda assim, as escolas públicas estão abaixo da média (6). Para estas, a meta é alcançar, apenas em 2021, a média dos países desenvolvidos.

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Educação pública para crianças e adolescentes: quando há um abismo entre a teoria e a prática

IDEB por região - Pernambuco

A desvalorização dos professores é um dos grandes problemas do ensino público sendo, talvez, o fator que mais interfere negativamente no processo de ensino-aprendizagem da criança. Segundo a cartilha de análise de finanças da prefeitura enviada pelo Simpere, Sindicato dos Profissionais de Ensino da Rede Oficial do Recife, não faltam recursos para a Prefeitura de Recife, em contrapartida, os investimentos do município em educação são cada vez menores. O fato confere ao Recife o título de capital do Nordeste que menos investe em professor: “A categoria vai amargando um profundo arrocho salarial, que não se justifica pela situação financeira atual da prefeitura [...] Em 2016, a Prefeitura do Recife gastou apenas 5,38 % da Receita Total com profissionais do magistério.  Esse valor é o mais baixo dentre todas as capitais do Nordeste. Recife é a quarta cidade do país entre as maiores cidades que menos investiu em profissionais do magistério”. Além do problema da falta de investimento adequado, o trabalho do professor se torna cada vez mais intenso e precário. Ainda segundo a cartilha enviada pelo Simpere “Os estados estão transferindo para as prefeituras a responsabilidade do ensino fundamental já há algum tempo, isso significou em Recife que os profissionais do magistério tiveram que dar conta de mais alunos sem que proporcionalmente fosse mantido ao menos a mesma quantidade de professores e sem o aumento da mesma proporção de escolas e estrutura adequada”.

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